Exposição UNIVERSCIENCE: “Os humanos mais violentos que antigamente?”
Um século após o fim da Primeira Guerra Mundial, a ultramidiatização da violência pode levar a uma supervalorização de sua importância. Esta é a tese defendida por um número crescente de sociólogos. Pesquisa de Pierre-Yves Bocquet
Responsáveis: Isabelle Bousquet e Alain Labouze
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O fluxo contínuo de informações de todo tipo que ilustram a propensão humana a maltratar sua própria espécie parece sempre demonstrar que as coisas vão de mal a pior.
Mas este sentimento não estaria sendo afetado pelo filtro exagerado das mídias?
Um século após o fim da Primeira Guerra Mundial, não estaríamos romantizando o passado e difamando o presente?
Esta é a teoria em contracorrente sustentada há alguns anos por alguns sociólogos, com base em números concretos. O que nos dizem as estatísticas sobre a violência e, sobretudo, como medi-la e quantificá-la? A época moderna é realmente a mais mortífera? A violência real e a violência sentida se sobrepõem? Como o riso, algumas formas de violência são próprias do Homem? Seria um instinto escondido nas profundezas de seu cérebro?
Quando se fala em violência, pensamos imediatamente nas guerras, nos atos terroristas, nos genocídios, nos homicídios em massa e assassinatos. Mas a violência é um fenômeno bem mais amplo e multifacetado.
Segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS), ela é definida como"a utilização intencional da força física, de ameaças a outros ou a si mesmo, contra um grupo ou uma comunidade, que cause ou possa causar traumatismos, danos psicológicos, problemas de desenvolvimento ou falecimento". Daí uma tipologia que tenta apreender o fenômeno sob todas as suas formas.
Fala-se, assim, de violência "racial","de caráter religioso","sexual","simbólica"(1); evocada"no trabalho","na prisão","na escola", podendo mesmo ser qualificada como "psicológica"... Esta última forma de violência só foi reconhecida pelo direito francês após a lei de 2010, aprovada no âmbito da repressão da violência contra as mulheres. Isto ilustra perfeitamente que a violência não se limita aos homicídios e que ela evolui não somente em amplitude, mas também em natureza, mudando de forma conforme a época. Uma das principais dificuldades encontradas pelos historiadores, psicólogos e sociólogos, no estudo da violência, é conseguir defini-la. Condição indispensável antes de estabelecer estatísticas e tirar conclusões...
Quando se fala em violência, pensamos imediatamente nas guerras, nos atos terroristas, nos genocídios, nos homicídios em massa e assassinatos. Mas a violência é um fenômeno bem mais amplo e multifacetado.
Segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS), ela é definida como"a utilização intencional da força física, de ameaças a outros ou a si mesmo, contra um grupo ou uma comunidade, que cause ou possa causar traumatismos, danos psicológicos, problemas de desenvolvimento ou falecimento". Daí uma tipologia que tenta apreender o fenômeno sob todas as suas formas.
Fala-se, assim, de violência "racial","de caráter religioso","sexual","simbólica"(1); evocada"no trabalho","na prisão","na escola", podendo mesmo ser qualificada como "psicológica"... Esta última forma de violência só foi reconhecida pelo direito francês após a lei de 2010, aprovada no âmbito da repressão da violência contra as mulheres. Isto ilustra perfeitamente que a violência não se limita aos homicídios e que ela evolui não somente em amplitude, mas também em natureza, mudando de forma conforme a época. (1)Teorizada pelo sociólogo Pierre Bourdieu e o epistemólogo Jean-Claude Passeron, a violência simbólica se funda em um mecanismo de dominação social : uma parte da população, socialmente e culturalmente desfavorecida, é dominada e desenvolve, assim, um sentimento de inferioridade frente aos intelectuais abastados.
Uma distribuição desigual no mundo:
No mundo, cerca de 437.000 pessoas foram assassinadas por homicídio doloso em 2012. Há mais de 50 anos, os níveis de homicídios na America foram 5 a 8 vezes superiores aos cometidos na Europa e Ásia.
TAXA DE MORTALIDADE
(Por 100.000 habitantes)
Uma baixa global em uma
escala de tempo prolongado.
Os progressos sociais tornaram certas regiões mais seguras como, por exemplo, a Europa Ocidental ou a América. A ligeira recrudescência dos homicídios observada desde os anos 1960 está associada à conjunção de diversos fatores, principalmente demográficos e socioeconômicos.
Taxa de homicídios na Europa Ocidental por 100.000 habitantes.
Uma parte dos atos de violência
NÚMERO DE INFRAÇÕES REGISTRADAS PELA POLÍCIA NA FRANÇA EM 2017
825 homicídios
8.500 assaltos à mão armada
40.400 estupros e agressões sexuais
86.755 assaltos violentos sem arma
153.700 roubos de verículos a motor
222.900 lesões corporais voluntárias
249.200 arrombamentos de moradias
Os cientistas concordam com o sociólogo alemão Norbert Elias e o historiador francês Robert Muchembled: a violência diminuiu significativamente na Europa e nos países desenvolvidos desde o fim da Idade Média (por volta do século XV). Razão: a partir do século XVI, o advento de sociedades cada vez mais atentas à civilidade e ao banimento dos crimes.
A interdição dos duelos decretada sob o reinado de Louis XIII, pelo Cardeal de Richelieu em 1626, simboliza assim a pacificação dos costumes em Versalhes e em outras cortes europeias. Esta criminalização progressiva de atos violentos, acentuada no século XVIII pelos movimentos iluministas – que atribuem à vida um valor cada vez mais importante -, vai resultar em uma baixa significativa da criminalidade. Segundo os números, consenso entre os historiadores e sociólogos, o número de homicídios no mundo passou aproximadamente de 100/100 000 habitantes por ano, no século XIII, a 10 no século XVII e a menos de 1 nos dias atuais. Esta média mascara, evidentemente, algumas disparidades: numerosos países da América do Sul (Honduras, Salvador, Venezuela…) ou da África (Zâmbia, Uganda, Lesoto…) indicam ainda índices muito elevados de homicídios, superiores a 20 por ano, em 100 000 habitantes.
Você sonha com a época épica dos cavaleiros, dos castelos ou dos torneios? Agradeça por não ter vivido neste período em que a violência e a tortura faziam parte do cotidiano.
Os cientistas concordam com o sociólogo alemão Norbert Elias e o historiador francês Robert Muchembled: a violência diminuiu significativamente na Europa e nos países desenvolvidos desde o fim da Idade Média (por volta do século XV). Razão: a partir do século XVI, o advento de sociedades cada vez mais atentas à civilidade e ao banimento dos crimes.
A interdição dos duelos decretada sob o reinado de Louis XIII, pelo Cardeal de Richelieu em 1626, simboliza assim a pacificação dos costumes em Versalhes e em outras cortes europeias. Esta criminalização progressiva de atos violentos, acentuada no século XVIII pelos movimentos iluministas – que atribuem à vida um valor cada vez mais importante -, vai resultar em uma baixa significativa da criminalidade. Segundo os números, consenso entre os historiadores e sociólogos, o número de homicídios no mundo passou aproximadamente de 100/100 000 habitantes por ano, no século XIII, a 10 no século XVII e a menos de 1 nos dias atuais. Esta média mascara, evidentemente, algumas disparidades: numerosos países da América do Sul (Honduras, Salvador, Venezuela…) ou da África (Zâmbia, Uganda, Lesoto…) indicam ainda índices muito elevados de homicídios, superiores a 20 por ano, em 100 000 habitantes.
Violência em baixa porém mais visível
Consequência da nossa sociedade da informação, a midiatização da violência é permanente e pode levar a uma supervalorização de sua importância.
Se a violência está realmente em baixa, por que temos a sensação contrária?
Este paradoxo pode ser explicado pela conjunção de vários fenômenos.
Primeiramente, neste momento da informação contínua e das redes sociais, o acesso a atos violentos nunca foi tão intenso: jornais e feed de notícias nos encharcam permanentemente com atos de violência perpetrados no mundo inteiro, podendo levar a um sentimento de medo e negativismo. Na França, segundo o Conselho Superior do Audiovisual (CSA), nós somos confrontados a dois assassinatos e a uma dezena de atos violentos por hora, além das ficções. Ou seja, para um telespectador « médio» que assiste televisão 3h30 por dia, um total de aproximadamente 2 600 mortes e 13 000 atos violentos por ano! Mesmo se estes atos estiverem longe de ser a regra, eles são vistos através de um filtro poderoso que reforça artificialmente sua importância.
Contudo, a exposição à violência parece favorecer os atos violentos. Este círculo vicioso, bem conhecido pelos psicólogos e sociólogos, foi novamente lembrado por pesquisadores americanos em uma meta-análise publicada em junho de 2018 no Journal of Social Issues.
Baseada em dezenas de estudos publicados nos últimos quinze anos sobre o assunto, esta síntese concluiu que ligações são cientificamente estabelecidas entre a exposição à violência nas telas (televisão, cinema, jogos de vídeo...) e a ocorrência de um estado de espírito agressivo, de uma dessensibilização à violência e de um déficit de empatia.
Se a violência está realmente em baixa, por que temos a sensação contrária?
Este paradoxo pode ser explicado pela conjunção de vários fenômenos.
Primeiramente, neste momento da informação contínua e das redes sociais, o acesso a atos violentos nunca foi tão intenso: jornais e feed de notícias nos encharcam permanentemente com atos de violência perpetrados no mundo inteiro, podendo levar a um sentimento de medo e negativismo. Na França, segundo o Conselho Superior do Audiovisual (CSA), nós somos confrontados a dois assassinatos e a uma dezena de atos violentos por hora, além das ficções. Ou seja, para um telespectador « médio» que assiste televisão 3h30 por dia, um total de aproximadamente 2 600 mortes e 13 000 atos violentos por ano! Mesmo se estes atos estiverem longe de ser a regra, eles são vistos através de um filtro poderoso que reforça artificialmente sua importância.
Contudo, a exposição à violência parece favorecer os atos violentos. Este círculo vicioso, bem conhecido pelos psicólogos e sociólogos, foi novamente lembrado por pesquisadores americanos em uma meta-análise publicada em junho de 2018 no Journal of Social Issues.
Vários estudos recentes chegaram mesmo a evidenciar correlações inesperadas.
O consumo de ômega 3, um ácido graxo essencial ao bom funcionamento dos neurônios, teria um impacto significativo sobre o mecanismo de ação da serotonina, um hormônio envolvido nos comportamentos impulsivos e agressivos.
Um estudo publicado, no final de 2017, na revista Psychiatry Research, por pesquisadores das Universidades de Grenoble e de Davis (Califórnia), revelou que a ingestão de suplemento em ômega 3, durante 6 semanas, entre aproximadamente 200 adultos, reduziria o número de comportamentos agressivos em cerca de 30 %. Resultados precários a serem considerados com cautela, pois foram baseados em declarações e não em situações reais.
Graças ao progresso da neuroimagiologia, foi possível identificar no cérebro circuitos neurais ligados às emoções, como o circuito da raiva, da agressão, do autocontrole ou do medo. Alguns trabalhos de neurocientistas, como o de Adrian Raine, chegaram mesmo a sugerir uma ligação entre as disfunções cerebrais (no nível do córtex pré-frontal e da amigdala) e comportamentos violentos.
Entretanto, estas teses, frequentemente baseadas no estudo dos cérebros de criminosos, são contestadas por uma parte da comunidade científica. Neuropsicólogos estimam que numerosos fatores ambientais – como a origem social, a pobreza, a superpopulação, o consumo de álcool e outras drogas, as relações familiares, a inserção social – influem consideravelmente sobre a passagem para o ato criminoso.
Vários estudos recentes chegaram mesmo a evidenciar correlações inesperadas.
O consumo de ômega 3, um ácido graxo essencial ao bom funcionamento dos neurônios, teria um impacto significativo sobre o mecanismo de ação da serotonina, um hormônio envolvido nos comportamentos impulsivos e agressivos.
Um estudo publicado, no final de 2017, na revista Psychiatry Research, por pesquisadores das Universidades de Grenoble e de Davis (Califórnia), revelou que a ingestão de suplemento em ômega 3, durante 6 semanas, entre aproximadamente 200 adultos, reduziria o número de comportamentos agressivos em cerca de 30 %. Resultados precários a serem considerados com cautela, pois foram baseados em declarações e não em situações reais.
Os cientistas frente ao terrorismo
Após os atentados de 13 de novembro de 2015 (137 mortes) em Paris, uma equipe de cientistas comandada pelo historiador Denis Peschanski (CNRS) e o neuropsicólogo Francis Eustache (Inserm) lançou um amplo estudo sobre a memória junto a 1 000 voluntários, vítimas diretas ou indiretas dos atentados. Efetuados ao longo de doze anos, estes trabalhos terão como objetivo principal compreender melhor a articulação entre memória individual e coletiva. Uma abordagem que se inspira no programa 911-Memory, conduzido pelo psicólogo americano William Hirst, após os atentados de 11 de setembro de 2001 em New-York (2996 mortes). Já está prevista uma análise comparativa dos resultados destes dois estudos.
Há muitos séculos que duas visões se opõem sobre a tendência do Homem a cometer atos de violência. Para uma corrente, o ser humano seria bom por natureza e seria, em seguida, pervertido por seu meio social. Para a outra, ele seria um animal como os outros que escuta seu instinto para satisfazer suas necessidades ou desejos mais primários; a educação, por sua vez, o desviaria dessa inclinação natural.
Um estudo tenha talvez resolvido em parte esta questão. Pesquisadores de três universidades espanholas publicaram na revista Nature, em setembro de 2016, um estudo comparando as mortes cometidas, dentro de uma mesma espécie, entre diferentes mamíferos, incluindo o humano, em função de sua posição na árvore da evolução.
Ao estudar 3 500 artigos sobre mamíferos – dentre os quais, aproximadamente 1 000 artigos sobre as causas da mortalidade entre os humanos – este estudo mostrou que 40 % das 1 024 espécies de mamíferos estudadas têm tendência a se matarem.
Isto pode também ser observado entre os animais aparentemente pacíficos e não carnívoros, como os cavalos, as marmotas ou os rinocerontes. A propensão a matar seus congêneres não seria própria à espécie humana, mas, ao contrário, seria generalizada no reino animal.
Esta propensão, observada no Homem, é bem próxima nos grandes símios, nossos primos próximos, mesmo não apresentando a mesma forma. Os primatas são habituados a infanticídios, acompanhados às vezes de canibalismo, como pesquisadores japoneses relataram, em outubro de 2017, no American Journal of Physical Anthropology, após terem observado um chimpanzé macho devorar um recém-nascido.
Há muitos séculos que duas visões se opõem sobre a tendência do Homem a cometer atos de violência. Para uma corrente, o ser humano seria bom por natureza e seria, em seguida, pervertido por seu meio social.
Para a outra, ele seria um animal como os outros que escuta seu instinto para satisfazer suas necessidades ou desejos mais primários; a educação, por sua vez, o desviaria dessa inclinação natural. Um estudo tenha talvez resolvido em parte esta questão.
Pesquisadores de três universidades espanholas publicaram na revista Nature, em setembro de 2016, um estudo comparando as mortes cometidas, dentro de uma mesma espécie, entre diferentes mamíferos, incluindo o humano, em função de sua posição na árvore da evolução.
Ao estudar 3 500 artigos sobre mamíferos – dentre os quais, aproximadamente 1 000 artigos sobre as causas da mortalidade entre os humanos – este estudo mostrou que 40 % das 1 024 espécies de mamíferos estudadas têm tendência a se matarem.
Isto pode também ser observado entre os animais aparentemente pacíficos e não carnívoros, como os cavalos, as marmotas ou os rinocerontes. A propensão a matar seus congêneres não seria própria à espécie humana, mas, ao contrário, seria generalizada no reino animal.
Esta propensão, observada no Homem, é bem próxima nos grandes símios, nossos primos próximos, mesmo não apresentando a mesma forma. Os primatas são habituados a infanticídios, acompanhados às vezes de canibalismo, como pesquisadores japoneses relataram, em outubro de 2017, no American Journal of Physical Anthropology, após terem observado um chimpanzé macho devorar um recém-nascido.
A responsabilidade das armas de fogo A repetição dos assassinatos em massa nos Estados Unidos (onde a liberdade de possuir uma arma está inscrita na Constituição) pode dar a impressão que a violência está em alta.
Duração: 1 min 40
merci OS HUMANOS MAIS
VIOLENTOS QUE ANTIGAMENTE?
Exposição concebida pela Cidade das Ciências e da Indústria, um espaço Universcience.